terça-feira, 27 de abril de 2010

tendências

O futuro da mídia e das marcas

O pensador alemão Gerd Leonhard expõe no Brasil suas previsões para a comunicação

Por Renata de Salvi, da revistapropaganda

Você, assim como todo mundo, já parou para pensar como será o futuro. Mas fugindo da fantasia fica difícil prever até o dia seguinte, o que dirá daqui a 20 anos. O alemão Gerd Leonhard não se inibe com o desafio e, com bastante embasamento técnico e teórico, imagina o que poderá ocorrer na mídia digital nos próximos anos. Recentemente, ele esteve em São Paulo a convite da agência nbs para dar a palestra “O Futuro da Comunicação e das Mídias Sociais”. A seguir, algumas opiniões do especialista.

Sair na frente é essencial
Basta ver exemplos na história para saber que quem inova tem seu lugar ao sol. Se Henry Ford tivesse perguntado à população o que queria para se locomover, teria como resposta “cavalos mais rápidos”. Entretanto, em vez de perguntar, começou a produzir carros. No início, a novidade normalmente é recebida com receio, assim como ocorreu depois que inventaram a prensa. A Igreja foi contra a Bíblia ser traduzida para várias línguas e lida em diversos lugares. A perda dessa centralização preocupou a instituição. O mesmo ocorreu quando lançaram o rádio. A indústria fonográfica foi contra porque acreditava que perderia o dinheiro dos shows. Hipótese totalmente errada, pois no final das contas o veículo foi usado como propulsor de músicas e artistas.
Outro caso mais recente é do videogame wii, da marca japonesa Nintendo, cujo grande atrativo é a interação do player com o jogo. No lançamento, houve dúvida quanto ao sucesso do produto porque, na opinião de algumas pessoas, o grande trunfo dos jogos era o conforto de sentar e usar apenas os controles, sem se exercitar. O resultado comprovou o contrário. Segundo Leonhard, a novidade foi o grande sucesso dos últimos cinco anos.

Mudança social
Segundo a Screen Digest, empresa de análise do mercado de mídia, mais de 30% de toda a publicidade será deslocada para digital, interatividade, mobile, vídeos, entre outros, nos próximos três anos. Esses dados revelam a transformação das relações dos consumidores com a marca, o comportamento das pessoas e as tendências que a comunicação deve seguir. Isso não quer dizer que a mídia de massa vá desaparecer, mas que é necessário haver convergência entre as plataformas.
O novo modelo é descentralizado com mobilidade, cross-media, interatividade e em tempo real. No lugar de uma empresa de mídia está a rede de notícia. Por isso, o conteúdo, a relevância e a conveniência são essenciais para a boa comunicação. Para Leonhard, nenhuma empresa gosta das mídias sociais porque terá que se preocupar com as opiniões dos consumidores. Mas ele garante que essa nova maneira de comunicar a marca pode deixar de ser ameaça e virar solução.

Finalmente, a democracia
A economia está diretamente ligada à tecnologia. Esse cenário traz o paradigma que a área de comunicação vai enfrentar. “Ninguém vai querer saber o que você disse há um ano, mas o que foi falado há cinco minutos”, diz Leonhard. Outro ponto importante é que, ao contrário do que ocorre atualmente na maioria dos pontos de contato, o consumidor tem voz, mostra sua satisfação ou insatisfação e toma conhecimento dos fatos em tempo real.
Algumas marcas já se deram conta de que a interação com o consumidor é fundamental. Recentemente, a montadora americana Ford divulgou a campanha “Ford Fiesta Movement”, que dava total liberdade aos consumidores. Para lançar o modelo nos Estados Unidos, uma iniciativa estimulava as pessoas a produzir um vídeo sobre o carro com o conteúdo que preferisse. Bastava usar a criatividade – não havia censura nem exigências com a qualidade – e concorrer ao carro zero. Segundo Leonhard, foi registrado aumento de 14% nas vendas porque essa ação tinha relação direta com a confiança entre o consumidor e a marca. A montadora coreana Hyundai também encontrou uma forma inusitada de incentivar a compra dos modelos nos Estados Unidos numa época de crise. Caso o consumidor perdesse o emprego, podia devolver o carro. “Era uma promessa simples. Poucas pessoas devolveram, mas as vendas aumentaram”, diz Leonhard.
Já o banco HSBC sentiu o gosto amargo que pode significar o novo momento das relações com as marcas. Leonhard conta que foi lançada na Inglaterra uma promoção que permitia aos estudantes utilizarem durante um ano o cartão gratuito. Depois de três meses em andamento, a instituição decidiu mudar as regras e cobrar cerca de 100 libras. Em pouco tempo, um grupo com milhares de pessoas se uniu na internet para criticar a mudança. Logo as ações do HSBC na bolsa de valores caíram.
A nova era também estimula a troca de conhecimento. A internet possibilita que se encontre livros a preços menores. Ou seja, algumas populações sem acesso a esses produtos conseguirão adquiri-los. No passado, se um africano quisesse o Harvard Business e precisasse importar, pagaria um valor absurdo. Encontrando-o na web o valor cai drasticamente.
Para ele, a tendência é que a hipercolaboração desbanque a hipercompetição. Em outras palavras, a chave da nova lógica é que todo mundo ganhe dinheiro. “As pessoas dizem que estou falando de comunismo, mas na verdade se trata de darwinismo. É a evolução natural”, explica.
A O’Reilly Books entendeu que a união com os concorrentes seria a melhor saída para enfrentar as novas tendências de consumo e não sair perdendo. Na web a equipe se apresenta como um site comunitário em que é possível compartilhar conhecimento e fornecer respostas trazidas por consumidores, autores, editores, conferencistas e amigos da marca. Pagando uma quantia fixa mensal, o internauta tem acesso a diversos livros.
A lógica comercial é a mesma de quando a televisão a cabo foi lançada. No início, algumas pessoas diziam que ninguém pagaria para ter canais a mais. Entretanto, atualmente, nem percebem que essa quantia é descontada todos os meses. “O grande desafio é transformar isso para os negócios. É encontrar uma forma para que seu serviço pareça gratuito”, diz.
Outro exemplo é a divisão dos lucros. A Amazon, site usado para fazer compras online, pode cobrar US$ 9,99 em algum produto e atingir uma pequena porcentagem de internautas. Entretanto, caso diminua o valor para US$ 1,99, a abrangência será bem maior. “É melhor pagar US$ 1 pelo e-book e o autor ter a parte dele nisso. Ao contrário do que ocorre atualmente com os livros impressos, nos quais o escritor é esquecido. O motorista do ônibus ganha mais que o autor. Isso não é um problema. Mas os dois precisam ganhar”, explica.

Marcas em destaque
A construção das marcas na era da banda larga, como o pensador alemão chama a nova era, vai exigir outra postura das empresas e, consequentemente, das agências de publicidade. Banners e pop-ups já são considerados ruídos de comunicação. “É como as telas em Bangcoc no meio da cidade. Fazem barulho o dia todo, custam caro e são ineficazes”, diz. “A atenção das pessoas é limitada e a ideia é conquistar essa atenção. Na internet, essa noção é poderosa”, completa.
É exatamente aí que entram as agências, cujo papel é filtrar o ruído e fazer com que a marca produza conteúdo, torne-se publisher. As conversas com os consumidores têm que levar em consideração os assuntos significativos para o público-alvo. Como se estivessem em tribos, os temas devem ser cruciais para os internautas. Para tanto, é necessário determinar qual é a mensagem que atrairia as pessoas para a marca. No marketing, a confiança passa a ser a moeda.
Outra dica é desenvolver algum agregador de valores para a empresa. Nesse caso, a experiência levada ao consumidor é essencial. Pode não ter nada a ver diretamente com a marca, mas que faça com que a pessoa interaja.

Estratégia bem definida
Segundo Leonhard, as empresas se dividem em três perfis: controladora, sem controle ou com controle camuflado. O Skype, programa que permite fazer chamadas gratuitas para outros números do próprio Skype, prefere deixar livre o uso do site. A Apple, por sua vez, tem uma visão mais tradicional de negócio, o que não a torna obsoleta. “Ninguém é como o Steve Jobs. Mesmo com a crise, a marca vende”, diz. O terceiro perfil é o caso do Google. A maioria garante que a marca não controla porque os serviços são gratuitos. Mas o Google não publica o Source Code da busca, ou código-fonte em português, e ainda tem acesso aos nossos dados.

Como ganhar dinheiro?
Todo mundo se faz essa pergunta. Os grandes YouTube e Facebook ainda não lucram com suas atividades. Mesmo o Google levou dois anos para superar essa fase e hoje é um gigante. Leonhard acredita que as cobranças poderão se basear no acesso por tarifa fixa. Assim, não se cobra o serviço ao mesmo tempo em que está sendo utilizado. No caso do YouTube, para ele os dados acessados podem ser usados para pagar os autores dos vídeos. Outra tendência é que as editoras de livros sigam o exemplo da indústria da música. Dessa forma, desenvolvam plataformas móveis para os livros eletrônicos.

Box: Quem é Gerd Leonhard?

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